quarta-feira, 23 de abril de 2008

Meu (Oz)

Hana Gonen, trinta anos, nascida em Jerusalém, é casada com um geólogo - o "meu Michel" - calmo, trabalhador, sensível, um bom cidadão que, ao contrário da mulher, se recusa a estender seus sonhos para além da linha do despertar. Para Michel, o tempo presente é a matéria dócil com a qual se deve moldar o futuro. Já Hana se apega à memória e às palavras como quem se agarra a um parapeito num lugar muito alto.

Com o passar do tempo, como uma ravina no deserto - tema da tese de doutorado de Michel -, a fenda entre os dois se alarga. Abandonada aos próprios pensamentos, girando em volta de si mesma, o mundo exterior aos poucos deixa de ser uma referência para ela. Os contornos se borram. Schízo - em grego, "cisão", "separação" - é o termo para esse desgarrar-se da realidade, para o delírio que aos poucos cresce dentro de Hana como uma planta exuberante quando atos, desejos, memória e palavra não mais coincidem.

Presente de aniversário, o vigésimo quinto. Colegas do trabalho, o agora único. Dois autores israelenses, coincidência. Vale quase não trocado, viagem, atraso. Este terminado hoje, começado há bocado. O outro, começar, terminar, sabe-se lá quando. Ambos pela propaganda, livro pela quarta capa. Da primeira, esperava demais. Da segunda, seja o que eu quiser, espero.
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mas certas passagens

[Quando Michel já estava lasso e saciado, disse a ele as palavras mais ternas que pude encontrar no coração: diga-me uma coisa, Michel, por que você disse uma vez que gosta da palavra tornozelo? Eu gosto de você por gostar da palavra tornozelo. Talvez não seja tarde para dizer que você é um homem gentil e sensível. Você é raro, Michel. Você vai escrever sua pesquisa e eu vou passá-la a limpo com uma linda caligrafia. Você vai fazer uma bela pesquisa, Michel, e Yair e eu ficaremos muito orgulhosos de você. Você também fará seu pai feliz. Novos dias virão. Nós vamos estar mais abertos um para o outro. Eu te amo. Na cantina do Terra Sancta eu já te amava. Talvez não seja tarde também para dizer o quanto adoro seus dedos. Não sei quais as palavras certas para dizer que eu quero muito ser sua mulher. Muito. // Michel estava dormindo. (...)]

["Matilda, essa é a senhora Gonen, minha esposa." // Matilda saiu. Michel pediu desculpas e dedicou uns cinco minutos à papelada. Provei o café e fiquei observando seu trabalho porque senti que Michel gostaria que o observasse naquele momento. Sentiu o meu olhar. Uma serena satisfação irradiava de seu rosto. Como é pouco o que devemos fazer para alegrar uma pessoa.]

me valem a pena

P.S.: E eu, que dele conheço outro quase o mesmo, gosto do modo como "ele" escreve como "ela", hum.
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(em ordem, Milton Lando? e Amós Oz)